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Empresas devem adotar transportes alternativos para colaboradores

15 dezembro 2024

Entrevista com Carlos Silva, presidente da EMEL

O desenvolvimento de uma solução de MaaS (Mobilidade-como-um-Serviço), através de uma oferta de serviços integrados de mobilidade, para fomentar o uso de modos sustentáveis e a integração dos processos de gestão e pagamento de despesas de transportes, foi o repto lançado pela EMEL às empresas que operam no concelho de Lisboa, onde grande parte do tráfego rodoviário resulta de movimentos pendulares e deslocações profissionais. Mas também a mobilidade em bicicleta é uma das vertentes centrais da estratégia da EMEL, pretendendo-se, a curto prazo, o desenvolvimento da rede GIRA e a sua extensão a todas as freguesias do concelho.

EUROTRANSPORTE - Como medida muito recente, a disponibilização, aos detentores de cartão Navegante, com passe válido, da possibilidade de estacionar gratuitamente nos parques da Ameixoeira, Colégio Militar e Av. de Pádua - de forma que evitem prosseguir com viatura particular até zonas mais centrais da cidade, retomando o percurso de outros modos - que efeitos já produziu, ou se já são mensuráveis?

Carlos Silva - A EMEL, enquanto empresa de mobilidade na cidade de Lisboa, tem vindo a gizar uma estratégia que acompanha boas práticas ambientais e simultaneamente prossegue iniciativas que beneficiam a cidade e sirvam as necessidades de todos os lisboetas, numa nova mobilidade mais verde, suave e sustentável. Os Parques de Estacionamento Navegante são, de entre as várias iniciativas, um bom exemplo deste desígnio. Estes parques situam-se por norma nas proximidades dos limites do concelho de Lisboa, em zonas de interface de transportes públicos e permitem a todos cidadãos que se desloquem para Lisboa em trabalho, estudo ou lazer, estacionar as suas viaturas privadas gratuitamente e de forma segura, efetuando o resto da viagem para o interior de Lisboa em transporte público. A medida tem sido bem recebida pelos utentes e com menos de dois meses desde a sua implementação e ainda em período de férias já se ultrapassaram as 700 adesões.

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Pretende-se replicar tal medida em outros parques?

Sim, neste momento, temos em curso a transformação de mais dois parques da EMEL, e até fim deste mandato a construção de outros dois novos parques, todos com a caraterística de se encontrarem próximos dos limites do município.

O aumento da capacidade e o número de parques dissuasores para cobrir mais áreas da cidade insere-se na mesma política?

O principal objetivo dos Parques Navegante é contribuir para a redução de atravessamentos e circulação das viaturas na cidade, incentivar o uso do transporte público e modos suaves de circulação, possibilitando a diminuição das emissões de gases com efeito de estufa e uma cidade descarbonizada com o ambiente mais saudável e equilibrado para todos. 

A EMEL tem vindo a assumir novas e crescentes medidas que tendem a contribuir para uma gestão integrada da mobilidade em Lisboa. O que implica, certamente, mais coordenação com a gestão dos transportes. Isso tem acontecido/está a acontecer? De que forma?

Quando foi criada, em 1994, a EMEL era uma empresa que geria e regulava apenas o estacionamento na cidade de Lisboa. Hoje, passados 30 anos, a EMEL passou a ser uma empresa de mobilidade, estendendo a sua ação a várias vertentes, nomeadamente a gestão de toda rede semafórica, as bicicletas partilhadas GIRA, os carregamentos elétricos e a construção de diversas infraestruturas que constituem hoje uma verdadeira rede de acessibilidade pedonal e ciclável na cidade, nomeadamente ciclovias, pontes ciclo pedonais como a do Rio Trancão e da Avenida Gago Coutinho, elevadores e Funicular da Graça. Projetos que colocam o cidadão no centro das nossas preocupações e que visam transformar comportamentos na sociedade.

Neste contexto de intervenção na mobilidade urbana temos vindo a articular estratégias com outras entidades, nomeadamente a CARRIS, num projeto que visa possibilitar o aumento da velocidade comercial de algumas carreiras, reduzindo os tempos de espera e melhorar a eficiência do transporte público, contribuindo assim para uma melhor mobilidade na cidade.

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A ampliação e disponibilidade da frota das bicicletas GIRA, especialmente em áreas menos servidas atualmente, está a ser levada em conta com tal transferência modal?

A mobilidade em bicicleta é uma das vertentes centrais da nossa estratégia. Foi decidido por este executivo municipal que a rede GIRA deveria ser estendida a todas as freguesias do concelho até ao fim deste mandato e o número de bicicletas disponibilizadas deveria duplicar.

Estes objetivos estão próximos de ser concretizados e vem assegurar, no que ao acesso e ao território diz respeito, a democratização do sistema. O acesso passou a ser gratuito para todos os residentes em Lisboa e quanto ao território vai chegar a todas as freguesias, permitindo a redução das desigualdades sociais. Estamos perante um modo de transporte que promove estilos de vida saudáveis e sustentáveis, simultaneamente amigo do ambiente e inclusivo do ponto de vista social.

Sinal do sucesso deste investimento são as mais de 2,7 milhões de viagens realizadas no ano passado, ultrapassando os 10 milhões de quilómetros percorridos. É nosso objetivo que a curto prazo, com a chegada a todas as freguesias do concelho de Lisboa, cada cidadão em Lisboa esteja a menos de 10 minutos a pé de uma estação GIRA.

Sendo que o objetivo é diminuir a entrada de automóveis no centro da cidade (em número próximo dos 360 mil veículos) e contribuir para a redução das emissões carbónicas, como pode a EMEL privilegiar a mobilidade das pessoas?

Acreditamos que mais do que proibir a entrada dos automóveis, é fundamental transformar comportamentos na sociedade. Isto aliado à criação de infraestruturas adequadas para que tenhamos uma mobilidade mais ecológica, eficiente e sustentável.

Uma das maiores dificuldades reside na necessidade de compatibilizar os interesses de todos os utilizadores do espaço público urbano, fundamentalmente em cidades consolidadas e com casco histórico com algumas centenas de anos. Mesmo assim, temos desenvolvido vários projetos que se complementam e que tendem a transformar os comportamentos.

Para além da GIRA, o maior projeto de mobilidade suave de Portugal, acreditamos que a mudança de comportamento por parte da sociedade se inicia com envolvimento das gerações mais novas. Nessa circunstância estamos a desenvolver um projeto pedagógico de educação para a mobilidade, o "Pela Cidade Fora".

Este programa vai às escolas do município e ajuda na sensibilização das crianças para a importância da mobilidade na vida urbana. A iniciativa incentiva os alunos a utilizarem transportes públicos e modos de mobilidade suave, promovendo comportamentos que contribuem para uma cidade mais verde e sustentável.

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O anunciado projeto de ligação ciclável Algés-Trancão é parte deste desígnio, mesmo que aquele corredor ribeirinho já seja servido por transportes coletivos [também já se fala em nova linha de elétrico a partir do Campo das Cebolas para Oriente]? Ou é meramente lúdico, para promoção da mobilidade ativa?

Este projeto de ligação tem em vista a disponibilização de uma ligação ciclável contínua, entre Algés e a Ponte Ciclo Pedonal do Trancão, construída recentemente pela EMEL. Esta ciclovia faz parte de uma estratégia que visa o alargamento da rede ciclável e em simultâneo melhora a conectividade da rede, permitindo a ligação com diferentes partes da cidade. Este eixo, apesar da sua dimensão lúdica, é estruturante para o fecho da malha de ciclovias existentes na cidade, mas permite acima de tudo um objetivo mais amplo do ponto de vista regional, que é permitir um conjunto de ligações intermunicipais que possibilitarão no futuro um percurso contínuo de bicicleta de Cascais a Vila Franca de Xira.

Que papel irá desempenhar a EMEL na futura regulamentação e/ou fiscalização (se lhe competir) dos veículos de animação turística (vulgo tuk-tuk) em zonas sensíveis da cidade, que não raras vezes contribuem para a menor fluidez do trânsito, senão mesmo para o congestionamento, ou ocupando ‘impropriamente’ lugares de estacionamento?

A EMEL, na base das suas competências na área de fiscalização de estacionamento, irá colaborar com a CML no cumprimento do que for regulamentado para esta atividade com especial atenção às zonas de “tolerância zero”, contribuindo assim para libertar a cidade em zonas que hoje são alvo de enorme pressão ao nível da mobilidade. 

O mesmo se passa relativamente aos veículos comerciais. O existente regulamento de cargas/descargas deverá sofrer alterações?

Os regulamentos existem e merecem sempre a melhoria pontual de alguns aspetos, pois nunca são perfeitos. A vida em sociedade altera-se, novos hábitos de consumo surgem e por esse motivo os regulamentos ficam sujeitos a constantes desatualizações. Mais importante do que um regulamento perfeito, será a existência de um processo de gestão de um sistema de estacionamento de cargas e descargas moderno, evoluído tecnologicamente, que permita de forma simples e eficaz a identificação de lugares para tal, bem como a possibilidade de um registo antecipado da reserva de lugar, contribuindo assim por um lado para o facilitar da vida dos operadores, que por vezes têm que dar voltas intermináveis ao quarteirão para efetuar uma entrega e, por outro, para uma redução significativa de congestionamentos de trânsito em segunda fila, permitindo melhor fluidez de tráfego.

Ao aumento da quilometragem da rede ciclável subsiste o problema de um dos eixos centrais da cidade (Av. Almirante Reis). Que papel terá a EMEL nesta matéria?

A configuração de todo o eixo encontra-se em revisão pela CML. Sobre esse tema, mais particularmente sobre a ciclovia, posso dizer que a EMEL está disponível para fazer parte da discussão para que se chegue à melhor solução possível.

Muito se tem falado da Mobilidade-como-um-Serviço (MaaS). Que projeto estuda a EMEL; em que oferta de serviços integrados de mobilidade, para fomentar o uso de modos de mobilidade sustentáveis, está a empresa a pensar?

A EMEL está a desenvolver uma solução de Mobilidade-como-um-Serviço (MaaS) para empresas. Será um MaaS corporativo, que irá oferecer serviços integrados de mobilidade. Este projeto está a ser desenvolvido pela nossa equipa de colaboradores no âmbito de um projeto financiado pela Comissão Europeia, o DeployEMDS.

O objetivo é permitir que as empresas possam disponibilizar estes serviços de mobilidade aos seus trabalhadores para deslocações casa-trabalho-casa ou para deslocações profissionais em Lisboa.

A solução está a ser desenvolvida em estreita colaboração com as empresas, para garantir que responde às suas reais necessidades e expectativas.

A EMEL acredita que a promoção da mobilidade sustentável e a redução do número de automóveis em circulação devem ser trabalhadas de forma concertada, até porque uma grande parte do tráfego rodoviário em Lisboa resulta das viagens casa-trabalho-casa e das deslocações profissionais.

Esta é, aliás, a razão que levou a EMEL a convidar as empresas, enquanto potenciais agentes ativos de mudança, a participar na criação de uma solução que promova a adoção de modos de transporte sustentáveis e alternativos ao carro.

No âmbito do PRR, em que principais projetos participa a EMEL, e que se pode esperar para a melhoria da mobilidade dos munícipes?

No âmbito do PRR, a EMEL participa no projeto “Bairro comercial digital de Alvalade”, encontrando-se a avaliar soluções tecnológicas que permitam a gestão e a fiscalização do estacionamento, incluindo bolsas de cargas e descargas, através da instalação de sensores de estacionamento e desenvolvimento de um sistema de verificação da ocupação e controlo dos tempos de paragem.

in Eurotransporte #142


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