II Fórum Mobilidade & Transportes
Uma parceria da revista Eurotransporte, eMobilidade+, CM Oeiras e Parques Tejo
Melhores transportes públicos, melhor mobilidade dos cidadãos, sob o grande chapéu da sustentabilidade, seja ambiental ou económica, mas que não esqueça a coesão social e o planeamento urbano, não meramente a nível local, mas também regional e inter-regional, para que os municípios não andem de costas voltadas e melhor se articulem pelos interesses comuns. O II Fórum Mobilidade & Transportes teve experientes e sábios oradores, abundante e interessada assistência, debates pertinentes e expressos desejos de novas e aprofundadas discussões destas matérias.
“Falar de política pública sem falar de sustentabilidade hoje não é possível”, disse Cristina Pinto Dias, secretária de Estado da Mobilidade, na sua alocução de encerramento do II Fórum Mobilidade & Transportes, ao cabo de dois dias dos finais de junho, no Centro de Congressos Taguspark, em Oeiras, cujo denominador comum versou a sustentabilidade na mobilidade. Em síntese temática versaram-se os transportes públicos de passageiros, o seu financiamento e estratégias, as infraestruturas e o planeamento urbano.
Mais de 30 oradores testemunharam pelas suas experiências profissionais, e mais que criticarem as políticas do país que tarde acordou para estas questões, apontaram caminhos, pediram mais opções públicas, financiamento e planeamento, pois se não são eles os decisores, mas meros operadores, técnicos, investigadores e reguladores, alguém tem que o fazer. Adiante se fará uma síntese do que esteve em debate, com links para as apresentações que enquadraram os temas e dos importantes contributos de encerramento do Fórum, as alocuções de Isaltino Morais, presidente do município de Oeiras, anfitrião do Fórum e da secretária de Estado da Mobilidade.
Cristina Pinto Dias aflorou também o trabalho que está a ser desenvolvido pelo Governo quanto à criação de pacotes de medidas de mobilidade, quer para passageiros, quer para o transporte de mercadorias, tal como a aceleração dos planos de mobilidade urbana sustentável para as áreas metropolitanas, dita como uma das prioridades do Governo, frisando que tal mobilidade “tem que chegar a todos, pela necessidade de coesão com os territórios de baixa densidade populacional.
O problema, dos vários que o país enfrenta em tais matérias, está identificado: “Quanto à quota modal, de 2011 para 2021 passámos de 62% para 66%, querendo isto dizer que aumentaram as viagens no modo de transporte individual, enquanto as viagens em transporte coletivo baixaram de 17% para 14%”, disse a secretária de Estado, em tom grave, acrescentando ser este o momento de nos articularmos, pelo que tal implica “uma política pública de descarbonização. É que não há volta a dar.”
Mais debates
Isaltino Morais disse ser necessário discutir mais estas matérias - a mobilidade e os transportes públicos e o contributo destes para a economia e a melhoria da vida das pessoas -, “pois estamos muito atrasados”, justificou. “E ainda falta saber qual o impacto que as grandes obras que aí vêm terão no ordenamento do território”, salientou o presidente da Câmara de Oeiras, referindo-se à terceira travessia do Tejo, sobre a qual diz ter uma visão distinta das demais, pois a ponte Chelas-Barreiro levará mais gente para o centro de Lisboa: “Não tenho dúvidas que uma melhor distribuição de empresas e da Academia beneficiaria todo o território da AML. Importa dizer que Oeiras é gerador do segundo maior PIB nacional, igualando o Porto e Gaia juntos, mas entre eles há cinco pontes sobre o Douro e a AML tem duas.” E deixou à consideração a possível ligação, em ponte ou túnel, do final da CREL, ou da CRIL, em Algés, até à Trafaria (Almada).
“Há que planear melhor. Há 20 anos lançámos o SATU (Sistema Automático de Transporte Urbano), que entretanto parou, e que estamos a retomar. Pois há 20 anos já sabíamos o que iria ser o corredor empresarial Paço d’Arcos-Taguspark. Ora, há aqui um défice de planeamento, razão pela qual temos que continuar estes debates.” A sessão, de dois dias, dir-se-ia que comungou da mesma opinião.
Rui Rei, presidente da Parques Tejo, homenageou Vítor Domingues dos Santos, vitimado por doença, antigo presidente do Metropolitano de Lisboa e presença assídua nestes encontros, anunciando depois que o município de Oeiras tornar-se-á também, em breve, operador de transportes públicos, pois já requereu o necessário alvará, e que o SATU, a que se referiu Isaltino Morais, irá chegar ao concelho de Sintra, também a pensar na transferência das instalações centrais do NovoBanco, e dos seus 2500 colaboradores, do centro de Lisboa para o Taguspark.
Sobre a “sustentabilidade nos novos contratos de serviço público de transporte de passageiros” ouviu-se que “a baixa densidade dos territórios não é amiga dos transportes públicos”, e que levar alunos da Amareleja a Évora, com paragens em Mourão e Reguengos, todos a tempo dos toques de aula, não é tarefa fácil (Ricardo Barros, CIM Alentejo Central). “Às CIM pediram que fizessem agora o que nunca foi feito nos últimos 50 anos” (Nuno Martinho, CIM Viseu/Dão Lafões). Paulo Simões (CIM Oeste) alertou que ainda não pode propor o valor do passe praticado em Lisboa, ainda que o serviço já tenha duplicado o transporte diário de utentes para a capital. E também esta: “Quem desenha as políticas e os algoritmos não sabe quantos carros deixaram de entrar em Lisboa.”
A mobilidade empresarial também tem os seus problemas. Assim mostram os estudos da TIS para o NovoBanco, que está de mudança de Lisboa para Oeiras. A verdade é que tais estudos apontam que os colaboradores ponderam fazer aumentar a quota modal do transporte individual para que não incrementem o tempo gosto nas viagens diárias.
Os custos do congestionamento
Sandra Lameiras (OPT) lançou para a discussão um número astronómico: é estimado em € 270 mil milhões os custos anuais do congestionamento de trânsito na UE e há indícios que os cidadãos não estão a fazer a devida transição modal. A Carris (operadora urbana de Lisboa) está a preparar um novo plano de carreiras e a dirigir o foco para a interação digital com o cliente. A Cooltra (mobilidade ligeira elétrica) dá ênfase à criação de novas aplicações para reforçar a multimodalidade e serviços last mile. Tal como a Lime (micro-mobilidade), que vai agilizar/simplificar a entrada no sistema para poder, ainda mais, ser complementar aos transportes públicos.
De Leiria surgiu o plano de edificação/deslocalização do novo terminal rodoviário. O anterior era privado e estava inserido no centro urbano, com todos os inconvenientes daí inerentes. Um projeto pensado para o futuro, quando em Leiria for construída a estação ferroviária para a Alta Velocidade.
Tais infraestruturas, mesmo que privadas, não podem barrar a entrada a qualquer operador, desde que a ocupação não esteja completa (Hugo Oliveira, AMT). A vereadora farense Sophie Matias explicou o que está a ser feito na cidade para obviar tais congestionamentos no atual terminal. Haverá um novo, provisório, e também um fluvial, mas sem distar mais da gare ferroviária do que atualmente.
Mais infraestruturas e incentivos
Filipe Carvalho, CEO da Wide Scope, empresa que planeia rotas de distribuição rodoviária para empresas nacionais e internacionais, admite que estas estão mais preocupadas em poupar dinheiro com os quilómetros percorridos, enquanto que Eduardo Ramos (Via Verde) lamenta que o país tenha perdido a oportunidade que o PRR encerrava com incentivos à compra de veículos elétricos para o transporte logístico.
“Os camiões necessitam de muita energia e a rede não está preparada, pelo que, provavelmente, teremos que utilizar todas as fontes de energia alternativa”, disse Lourenço Sousa, da Acciona, enquanto que Paulo Branco, da ABB, recordou quer vai ser preciso muito investimento, pois a regulamentação europeia impõe que, a partir de 2025, exista de 60 em 60 km na rede transeuropeia de transportes, postos de carregamento de 350 kW para os camiões. “A eletrificação parece ser o caminho mais simples, e se o hidrogénio é uma bonita solução, é muito mais caro”, disse ainda. Em uníssono, a solução apontada pelos oradores passará pelos incentivos à transição energética.
Quanto aos transportes em sítio próprio (ditos BRT), segregados do resto do tráfego, os vereadores das autarquias de Cascais, Lisboa e Oeiras admitem que há acordo entre todos para que os três concelhos possam criar uma alternativa à Linha de Cascais, seguindo pela A5. A palavra está do lado da Brisa, e do Governo. Joana Batista, por Oeiras, disse que os planos de mobilidade há muito que estão elaborados e que os governantes têm que olhar prioritariamente para estes sistemas. Pedro Dinis (CM Lisboa) defende ser “impensável que as pessoas demorem uma eternidade a chegar aos seus destinos e seria bom que o Governo bebesse das decisões destes municípios”, dizendo ainda que a Carris está a avaliar com o município qual o melhor sistema alternativo para ligar Lisboa a Oeiras.
Aeroporto e alta velocidade
Rosário Partidário (IST), que presidiu à Comissão Técnica Independente que estudou a melhor localização para o futuro novo Aeroporto da Região de Lisboa, deixou uma questão no ar: queremos ou não ser um hub intercontinental de aviação, que a nossa posição geoestratégica atlântica favorece? Deixou também uma possível resposta: é tudo uma questão de opção política, o que foi partilhado por Mário Chaves, comandante da TAP, para quem a alta velocidade ferroviária combinada com os aeroportos potencia muita coisa. Mas a respeito da sustentabilidade do setor, advertiu que os combustíveis SAF (menores emissões) atualmente não chegam, nem pouco mais ou menos, para todos os aviões.
Muito na ordem do dia, a alta velocidade (AV) vai abrir portas para a entrada de novos operadores a partir de 2029. Carlos Mendes (CP) afirmou que este operador terá que racionalizar a sua estrutura e desonerá-la para ficar mais competitiva. “A competição é desejável e a CP não tem receio”, disse. Alberto Ribeiro (B Rail) chamou a atenção para a necessidade de maior atenção das autoridades de concorrência e regulação para a transparência de todo o processo, e também para a questão dos preços (tendencialmente para baixar). Os exemplos que vêm de Itália e Espanha falam disso mesmo. O certo é que entre 2029 e o início da exploração da AV, anunciado para 2032, iremos ter grandes constrangimentos da capacidade de circulação entre Lisboa e o Porto, mas também foi dito que, por via da AV, Lisboa e Madrid juntas serão a melhor plataforma logística do mundo ocidental, tal como o eixo Valência-Sines deveria ser alvo de grande investimento, como referiu António Sales (Sudeste Ibérico em Red).
Fotos Rogério Grilho
In revista Eurotransporte n.º 141